O Sete de Setembro
Na última quarta-feira comemoramos a independência do Brasil. Essa data festejada com alegria, civismo e grande frenesi por toda população é considerada a mais importante para o povo brasileiro. No entanto, sabemos nós realmente o que de fato aconteceu naquele longínquo 1822. Onde está a verdade? Como separá-la dos mitos que a acompanham?
Um dos mitos mais propagados é que a independência foi um fato isolado, um acontecimento heróico, que teve na liderança de Dom Pedro a razão principal de sua existência. Muitos se esquecem de localizar a independência do Brasil como mais um capítulo da crise do antigo regime europeu e do antigo sistema colonial. Além disso, há alguns anos ocorriam diversas revoltas contra a metrópole portuguesa no Brasil, como a Inconfidência Mineira e a Conjuração Baiana, que colocavam em xeque o poderio português na sua colônia americana.
E não deve ser apenas essa a dúvida que você, caro leitor, carrega sobre nossa data pátria. Muitas outras perguntas ecoam, sem dúvida em vossa mente. Quando se deu realmente a Independência do Brasil? Porque, quando consultamos os jornais de 1822, não há nenhuma referência ao que se passou nas margens do Ipiranga em 7 de setembro?
Porque aquele episódio foi escolhido em detrimento de outros, quando sabe que, em 1822, a data tomada como marco da Independência foi o 12 de outubro, dia do aniversário de dom Pedro I e de sua aclamação como imperador?
Esse artigo, com certeza, não responderá todas as questões relativas ao tema, mas por que não debater algumas? Uma verdade é incontestável: desde a chegada da corte portuguesa ao nosso solo, em 1808, já se pensava a emancipação de nosso país. Em 1815, o Brasil foi elevado à condição de Reino Unido a Portugal e Algarves e esse fato político por si só determinava uma nova perspectiva para o país. O ano de 1822, nessa visão, foi uma etapa natural do processo de independência de uma nação submetida ao jugo de um povo europeu.
Um dos pontos que mais me chama a atenção sobre nossa data magna, é o fato do primeiro relato detalhado sobre o aclamado episódio do Ipiranga só ter sido publicado em 1826, em momento de desprestígio do imperador Pedro de Alcântara Francisco António João Carlos Xavier de Paula Miguel Rafael Joaquim José Gonzaga Pascoal Cipriano Serafim de Bragança e Bourbon (ou simplesmente: Dom Pedro I) diante dos brasileiros que tinham feito a Independência e que se indignaram com as bases do tratado assinado com Portugal.
Quiçá aquela imagem heróica dos acontecimentos que envolveram o 7 de setembro e que povoa a mente dos brasileiros tenha sido eternizada pela pintura de Pedro Américo, Independência ou Morte. O quadro nos mostra a figura de Dom Pedro ao centro num ato bravo, declarando nossa emancipação política. O que muitos se esquecem, entretanto, é o fato desse quadro ter sido encomendado pelo Imperador Pedro II, que queria eternizar aquele momento-chave para a história brasileira. Dizem que Pedro Américo teria se inspirado em Ernest Meissonier, o que era comum aos pintores da época. Basta que você, caro leitor, acesse o Google imagens e verá como o quadro de Pedro Américo mostra-se praticamente uma cópia daquele que ilustra Napoleão III na Batalha de Solferino.
Outro mito sobre nossa independência é de que ela teria alterado muito das características políticas, econômicas e sociais existentes na época. Isso não é verdade. A independência, infelizmente, serviu mais aos interesses das oligarquias agropecuárias do que ao povo. O “sete de setembro” consolidou o modelo monárquico, agro-exportador, baseado na mão-de-obra escrava negra e uma sociedade altamente concentradora de riqueza e desigual.
Mais uma fábula, cantada em verso e prosa, é a de que não houve nenhuma participação popular no processo de independência. Houve sim, e não apenas em nosso Estado. Não faltaram guerras em várias partes do País. Além da Bahia, outras províncias, como a Cisplatina (depois independente e batizada de Uruguai), o Grão-Pará e o Maranhão lutaram para assegurar nossa independência através de conflitos intensos e da morte de muitos mártires.
Por fim, passado o 7 de setembro, gostaria de deixar a seguinte reflexão: por que não utilizar essa data para pensar na nossa identidade enquanto brasileiros, naquilo que produzimos de positivo para o mundo e naquilo que queremos para a nossa nação?